João Carlos da Cunha*, Carlos Cesar Garcia Freitas**, Luiz Fernando de Lima***, Marcos Roberto Kühl**** y Sergio Luis Dias Dôliveira*****
Recibido:16-03-2010 - Aprobado: 15-08-2010
RESUMO: |
|
RESUMEN: |
---- |
||
ABSTRACT: The objective of this study is to examine whether Agrarias’s administration R&D, a cooperative firm of the Paraná can be classified as intuitive, systematic, intentional or sustainable and what the likely reason for it lies at the level identified. It was observed that administration of R&D of the Agrária is at a time of transition, it is not possible to fully define which generation it is, but the results indicate a tendency to shift from second to third generation and the reasons for the transition are related, in general, the market demands. Keywords: P&D. P&D Management. Cooperative agribusiness. |
A Administração da Tecnologia, assim como das áreas de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) têm, ao longo do tempo, sofrido drásticas mudanças. Primeiramente grandes empresas desenvolveram inúmeras estratégias para sua gestão tecnológica, já que o conhecimento tecnológico enfatiza a necessidade de estratégias para habilitar-se a construir conhecimento nos centros tecnológicos e para acessar tecnologias emergentes, com vistas a garantir a sobrevivência e a competitividade de longo prazo. Em segundo lugar, em um curto espaço de tempo o mercado tem introduzido novos produtos e em muitos setores as empresas encurtam seu ciclo de inovação e incluem o tempo de mercado como uma parte significativa de suas inovações e da estratégia competitiva. O terceiro aspecto é o processo integrado de desenvolvimento, engenharia simultânea e a grande ligação entre P&D, produção, marketing e vendas que cada vez mais emerge como uma parte importante da estratégia de inovação. Em quarto lugar, pode ser observado o significativo e extenso crescimento das redes tecnológicas promovendo a interação entre a indústria e os sistemas públicos de pesquisa. Em quinto lugar, existe uma tendência para a internacionalização das atividades tecnológicas desde o início dos anos 80 que requerem uma nova forma organizacional. (EDLER, et. al., 2002, p. 149)
Assim, as atividades de P&D dentro de um mercado atualmente competitivo precisam estar integradas com as demais áreas da empresa, e esta integração é uma característica da administração contemporânea, diferentemente do que ocorria no passado, quando P&D e a administração possuíam visões diferentes, e colocavam-se dentro das organizações a partir de perspectivas distintas.
Estas diferenças de características entre a administração contemporânea de P&D e a utilizada no passado são classificadas, atualmente, em quatro formas de administração de P&D: de primeira geração, de segunda geração, de terceira geração e de quarta geração. (ROUSSEL, et.al., 1992).
Essas quatro formas, ou gerações, indicam o modo como é administrada a área de P&D, sendo, respectivamente: de modo intuitivo, de modo sistemático, de modo estratégico e intencional ou de modo sustentável, com vistas a fazer frente ao que foi destacado inicialmente.
Segundo a literatura o modo intuitivo é remanescente do final da década de 50 e início da década de 60. Porém, isso não quer dizer que por ser remanescente do passado tenha automaticamente sido substituída pelas outras gerações, principalmente no Brasil, que apenas recentemente (década de 90) abriu seu mercado à concorrência internacional e batalha pelo desenvolvimento tecnológico nacional, buscando desenvolver uma condição mais adequada de competitividade interna e externa.
Existem alguns setores da atividade empresarial que são particularmente afetados pela evolução tecnológica e pela necessidade de alcançar a vantagem competitiva em relação aos concorrentes, a partir principalmente de práticas de inovação em seus processos produtivos. Um destes setores é o dos gêneros alimentícios, especialmente o desenvolvido cooperativamente.
As Cooperativas Agropecuárias do Paraná representam uma área da economia que se configura de maneira diferenciada e com alto grau de complexidade. Observa-se isso em virtude da quantidade da riqueza gerada e das características sociais que acaba por representar. Neste aspecto, deve-se levar em consideração suas contínuas melhorias, tanto nos processos de produção, como de transformação, tanto quanto de distribuição de alimentos, especialmente nos últimos cinco anos. Observa-se também o particular movimento de constante aperfeiçoamento das práticas tecnológicas no campo. São vários esses processos incrementais e que se disseminam no setor cooperativista. Nesse sentido os ganhos de competitividade são visíveis.
Além desses fatores iniciais, o segmento recebe também forte influência do mercado mundial de commodities agrícolas, um ambiente cada vez mais globalizado e competitivo. Das 234 cooperativas registradas no Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (OCEPAR) em 2008, 80 delas são Cooperativas Agropecuárias e respondem por aproximadamente 55% da economia do Estado, o que denota a sua relevância para as para o Estado e para o País (OCEPAR, 2008). Essas características setoriais apresentam padrões marcantes e idiossincrasias que tornam necessária uma exploração científica dos relacionamentos econômicos e sociais das cooperativas agropecuárias na formação e gestão de suas ações Estratégicas e de P&D. Observa-se, também, que essas atividades são em especial amplas, complexas e interativas.
Diante disso, a empresa escolhida faz parte do ambiente cooperativista do Estado do Paraná e está situada em Guarapuava, na região de centro-sul do Estado. Trata-se da Cooperativa Agrária Agroindustrial que em 2008 tinha 539 associados e 968 funcionários, alcançando um faturamento na ordem de 1,5 bilhões de reais neste mesmo ano. (AGRARIA, 2009).
Assim sendo, a administração de P&D da Cooperativa Agrária, empresa paranaense do ramo cooperativo, pode ser classificada como sendo intuitiva, sistemática, intencional ou sustentável (de primeira, segunda, terceira ou quarta geração, respectivamente) e quais os prováveis motivos para a mesma se encontrar no nível identificado? Em suma, pretende-se neste estudo identificar em que nível se encontra a administração de P&D da Agrária e quais os prováveis motivos que fizeram ou estão fazendo com que a organização esteja nesse nível de administração de P&D. O estudo foi conduzido por meio da aplicação de questionário semi-estruturado.
A importância deste tipo de estudo é explicada por Roussel, et. al. (1992, p. 24) quando afirmam que “reconhecer quais gerações de administração de P&D são praticadas em sua empresa oferece uma base para a mudança, quando a mudança for apropriada. Como se faz esse reconhecimento? Através dos traços mais importantes das gerações [...].”
O estudo é composto, além desta introdução, de uma parte que aborda o referencial teórico, outra que trata dos aspectos metodológicos do estudo, a que relata o estudo de caso e por fim uma parte em que são tecidas as considerações finais.
Um ambiente totalmente diferente apresenta-se às organizações, comparável de modo relativo ao que foi a Revolução Industrial para sua época. Hoje a era do conhecimento desafia as organizações a repensarem sua administração e, além disso, outros elementos como a globalização, a evolução da ciência e tecnologia, a abertura de novos mercados, a concorrência internacional, a maior exigência dos consumidores, as políticas governamentais e ambientais rígidas e diversos outros fatores compreendem o novo discurso comum do cenário empresarial atual. Cenário que propõe muitas oportunidades de novos negócios, porém, que também oferece muitas ameaças, na qual ambas exigem uma postura pró-ativa das organizações no intuito de se adaptarem às mudanças, exigindo até um esforço ainda maior para que se antecipem e se preparem para essas oportunidades e ameaças como forma de obtenção de vantagem competitiva.
Numa ação dual de manutenção e mudança, as organizações precisam de modo estratégico decidir sobre em quais “ondas” (ALBRECHT, 1994) manter seus negócios e quais deixar passar. Para isso, compreender seu contexto é premissa básica de gestão. Neste exercício a definição da administração estratégica passa a ser essencial para a sobrevivência do negócio, pois num “mar infinito” de oportunidades e ameaças o sucesso estratégico da organização não consistirá em tentar abarcar o “mundo”, mas, pelo contrário, encontrar seu lugar neste, ou seja, fazer escolhas adequadas ao seu contexto de atuação. A orientação de Porter (1996, p. 2) acerca de que posicionamento estratégico consiste em desenvolver ações diferentes ou de modo diferente de seus rivais, indica o norte aos administradores, para manterem o foco de suas ações e explorarem ao máximo as tendências, atuais, futuras e potenciais.
Assumir o controle sobre o destino, enxergar as oportunidades, transformar ameaças em oportunidades, definir novos rumos ao negócio, mobilizar recursos para um objetivo comum, promover a mudança, entre outros (FERNANDES; BERTON, 2005, p. 5), correspondem à importância da administração estratégica para a organização que deve mover-se de modo integrado na busca do constante aprimoramento da excelência operacional (PORTER, 1996, p. 1). Excelência que pode se traduzir em um perfeito alinhamento com seu mercado e que se revela na busca pela satisfação do cliente para conquistá-lo e mantê-lo.
Mattos e Guimarães (2005, p. 12) destacam que neste ambiente de super competição em que as organizações se encontram, os esforços de diversificação acabaram dando espaço para a especialização como resposta ao objetivo de satisfazer o cliente. Porém está ação resultou numa reação que gerou “uma necessidade iminente dos processos produtivos em busca de flexibilidade de produção e, principalmente, uma busca incansável das empresas pela inovação de bens, serviços, comunicação e gerenciamento”. Deste modo os processos de inovação passam a focar novas maneiras de criar valor para os clientes. (KAPLAN; NORTON, 2004, p. 5).
No universo dos negócios não há como se falar em inovação sem se referir a tecnologia. De modo geral esta pode ser entendida como a comercialização da ciência e consiste na “aplicação sistemática do conhecimento científico a um novo produto, processo ou serviço” e a mudança destes (manifestações da tecnologia) consiste na inovação. Deste modo a inovação pode ser conceituada como “uma mudança na tecnologia – um abandono das maneiras anteriores de fazermos as coisas” ou ainda pode ser entendido como uma ação “para formas diferentes de fazer as coisas” (BATEMAN; SNELL, 2006, p. 551). Porém “a tecnologia só será um fator de competitividade se o plano de desenvolvimento tecnológico estiver coerente com a estratégia global da empresa”. (VASCONCELOS, et. al., 1992, p. 23).
Deste modo, o alcance das formas diferentes de fazer as coisas passa pela inovação tecnológica que deve estar apoiada numa administração estratégica de pesquisa e desenvolvimento (P&D), integrada com o planejamento estratégico geral, do qual emanam orientações aos processos de desenvolvimento de produtos. (ROZENFELT, 2006, p. 52).
“Administrar estrategicamente P&D significa, antes e acima de tudo, integrá-la na tecnologia e na estratégia de negócio”. E, por meio desta integração gerir os processos de P&D incluindo-os amplamente com as demais peças/ações críticas da estrutura corporativa geridas pela organização. (ROUSSEL, et. al., 1992, p. 17).
Os esforços de P&D devem ser realizados por meio de um esforço cooperativo entre sua área responsável e as demais áreas da empresa, e compreendido estrategicamente como desdobramentos da Administração Estratégica da Organização, pois estes não se justificam por si sós. Suas atividades apenas promovem aumentos de competitividade às organizações quando os resultados dos projetos de inovação tecnológica acabam por ser incorporados nos produtos e serviços oferecidos ao mercado antes dos concorrentes. (VASCONCELOS; et.al., 1992).
O fato de P&D ser algo novo, de trabalhar com ações à longo prazo, dos erros fazerem parte do processo, dos altos riscos envolvidos, das incertezas das previsões, da falta de informações precisas e das diferenças de linguagem e cultura, são apenas alguns dos aspectos que colocam em “cheque” a existência do planejamento e desenvolvimento nas organizações e por outro lado torna imprescindível e importante uma efetiva administração estratégica de P&D. “Nossa tese é de que a alta administração de unidades de negócios e corporativa deve ingressar na era da administração de P&D [...]”. (ROUSSEL, et. al., 1992, p. 3).
A partir da metade do século XX, começa a surgir o que hoje é chamado de administração de P&D e esta vem evoluindo e tende a evoluir sucessivamente como ocorre com outras áreas do conhecimento. Diante disso atualmente já são delimitadas de forma bastante consistente quatro gerações da administração de P&D. Estas gerações são apresentadas de forma detalhada na seqüência.
Além destas, já relativamente consolidadas pela literatura, uma quinta geração já vem sendo citada por alguns autores, mas que ainda depende de um processo crítico de estudo para que venha a se consolidar e ser efetivamente considerada como uma nova geração.
Para Paez (2000, p. 67) a administração de P&D de primeira geração consistia em ações centralizadas e desvinculadas das unidades de negócio, porém dotadas de recursos ilimitados. Ações que podem ser consideradas como uma:
[...] ‘estratégia da esperança’, em que dada uma mistura adequada de cérebros, capital e tempo, as inovações intuitivamente surgiriam para dar soluções técnicas aos problemas. Dentro desse quadro, o processo de inovação, em seu sentido mais amplo, tinha seu desenvolvimento obedecendo à uma seqüência linear, com ênfase dada em P&D, ficando o mercado como um mero receptáculo dos resultados conseguidos (ou modelo de oferta de P&D).
Segundo Roussel, et. al. (1992, p. 34) a administração de P&D de primeira geração tem sua origem no final dos anos 50 e início dos anos 60 e é caracterizada pela falta de uma estrutura estratégica para a área de P&D e para a administração da tecnologia. Coombs (1996, p. 348) indica que o período de domínio da primeira geração foi de 1950 à 1970 e sua característica é a centralização e o domínio corporativo sobre o financiamento, a propriedade e o controle de P&D. Já para Edler, et. al. (2002, p. 152) o seu início ocorre em meados dos anos 60 e é caracterizada pela carência de estruturas estratégicas de longo prazo para a administração de P&D, e ainda destaca que existe uma ligação implícita entre os negócios e a estratégia de P&D.
Em termos estratégicos, “a filosofia administrativa é caracterizada pela falta de confiança nas relações entre a administração de negócios e a administração de P&D”. Os gerentes de P&D “decidem o que, quando, por quem e por quê”. Já os gastos são aprovados em linha gerais pela administração e não estão definidos os prazos de conclusão dos projetos. A organização é por centros de custos de disciplina técnica ou cientifica. A P&D está centralizada corporativamente ou divisionalmente, mas a parte da pesquisa incremental está distribuída nas unidades. (ROUSSEL, et. al., 1992, p. 25 – 27).
Operacionalmente, as decisões financeiras são definidas apenas como uma linha no orçamento anual já que não se tem uma visão das necessidades tecnológicas futuras. A alocação dos recursos fica a critério de P&D e somente os gerentes tem conhecimento de como eles são investidos. O estabelecimento de datas alvo é algo inconcebível, assim como a definição de prioridades. Avaliação de P&D por meio da medição dos resultados é superficial tanto quanto é superficial a avaliação do progresso cientifico e tecnológico. (ROUSSEL, et. al., 1992, p. 27 – 30).
No Quadro 1 estão resumidas as características da administração de P&D de primeira geração.
Quadro 1 – Características da administração de P&D de primeira geração (modo intuitivo)
1 Contexto estratégico |
|
1.1 Filosofia |
|
1.2 Organização |
|
1.3 Estratégia de P&D/Tecnologia |
|
2 Princípios operacionais |
|
2.1 Financiamento |
|
2.2 Alocação de recursos |
|
2.3 Determinação de alvos |
|
2.4 Estabelecimento de prioridades |
|
2.5 Medição de resultados |
|
2.6 Avaliação de progresso |
|
Fonte: baseado em Roussel, et. al. (1992, p. 29).
Para Paez (2000, p. 67 - 68) a administração de P&D de segunda geração pode ser contextualizada e resumida do seguinte modo:
Em face das pressões advindas das restrições de recursos, popularização de tecnologias e aumento da competitividade empresarial, a administração de P&D dentro das corporações tendeu à descentralização. O importante era atender às necessidades comerciais das unidades de negócio e de atuar por meio de projetos, avaliados quantitativamente em termos de seus benefícios/custos, mas com evidentes dificuldades em estabelecer prioridades estratégicas entre projetos, entre unidades de negócio e de P&D, e da corporação como um todo. O correspondente processo de inovação obedecia a uma seqüência linear, mas agora no sentido inverso: a ênfase passou a ser dada ao mercado, e a P&D assumiu um papel reativo (ou modelo de demanda de P&D).
Para Razuk, et. al. (2005, p. 4) a administração de P&D de segunda geração tem sua origem em 1975 e perdura até 1990, e segundo Roussel, et. al. (1992, p. 30) trata-se de um estado transitório entre a administração de P&D intuitiva (de primeira geração) e a intencional (de terceira geração). Já Coombs (1996, p. 349) indica que o período de domínio da segunda geração foi de 1970 ao final dos anos 80 e sua característica é a descentralização e o domínio das unidades de negócios sobre o financiamento, a propriedade e o controle de P&D.
Em termos estratégicos, a filosofia se caracteriza pela relação de equilíbrio entre a defesa e o patrocínio de P&D em relação às metas estratégicas, e pela relação cliente/fornecedor entre os gerentes de negócios e os gerentes de P&D. “Formula planos para P&D numa base de projeto a projeto, separada e independentemente para cada negócio ou para a corporação”. (ROUSSEL, et. al., 1992, p. 31 – 32).
Ou seja, essa compreensão insere-se dentro de uma concepção, na qual, se estabelece a forma da estrutura como aspecto determinante das estratégias a serem desenvolvidas, em especial as relacionadas à Inovação.
Operacionalmente, os financiamentos da pesquisa fundamental são estabelecidos pelo que a empresa pode gastar, da pesquisa radical baseados nas necessidades atuais e dos novos negócios e tecnologias, e da pesquisa incremental pela negociação entre os gerentes de negócios e os gerentes de P&D. A alocação dos recursos e a determinação das prioridades variam ao longo de toda P&D. A medição dos resultados é feita quantitativamente, apesar das lacunas informacionais no mercado em relação às necessidades futuras. A avaliação do progresso se dá por meio de cuidadosos sistemas de revisão e pela comunicação regular dos resultados alcançados. (ROUSSEL, et. al., 1992, p. 32 – 35).
No Quadro 2 estão resumidas as características da administração de P&D de segunda geração.
Quadro 2 – Características da administração de P&D de segunda geração (modo sistemático)
1 Contexto estratégico |
|
1.1 Filosofia |
|
1.2 Organização |
|
1.3 Estratégia de P&D/Tecnologia |
|
2 Princípios operacionais |
|
2.1 Financiamento |
|
2.2 Alocação de recursos |
|
2.3 Determinação de alvos |
|
2.4 Estabelecimento de prioridades |
|
2.5 Medição de resultados |
|
2.6 Avaliação de progresso |
|
Fonte: baseado em Roussel, et. al. (1992, p. 34).
Para Paez (2000, p. 68) a administração de P&D de terceira geração pode ser contextualizada e resumida do seguinte modo:
A administração de P&D passa a ser intencional e estrategicamente orientada, na qual se fundem os modelos de oferta de P&D e de demanda de P&D. O portfólio de projetos de P&D é estabelecido e as prioridades dadas em função dos objetivos estratégicos da corporação. Tais projetos de P&D realizam-se em parceria com as unidades de negócio, têm caráter multidisciplinar e contribuem para identificar oportunidades tecnológicas em negócios atuais e/ou perspectivos. Nesta situação, o correspondente processo de inovação, embora ainda seqüencial, passa a dispor de mecanismos de retroalimentação entre a P&D (oferta) e o mercado (demanda)
Neste caso a administração procura criar “um portfólio de P&D estrategicamente balanceado, formulado conjuntamente num espírito de parceria entre os gerentes gerais e os gerentes de P&D”. (ROUSSEL, et. al., 1992, p. 35).
Segundo Razuk, et. al. (2005, p. 4) a administração de P&D de terceira geração tem sua origem em 1990 e vai até 1999. Coombs (1996, p. 349) indica que o período de domínio da terceira geração iniciou-se em 1990 e suas características são: a integração dos elementos das gerações anteriores; separação conceitual entre financiamento tecnológico e financiamento de produto; misto do financiamento corporativo e das unidades de negócios com atenção ao balanceamento de incentivos; e partilhamento corporativo e domínio da unidade de negócios do portfólio e recursos de P&D.
Em termos estratégicos, a filosofia administrativa é de se buscar criar “um espírito de parceria e confiança mútua entre os gerentes gerais e de P&D”; organizar P&D de forma a romper seu isolamento em relação ao restante da organização. A formulação das estratégias corporativas de negócios, P&D e tecnologias integradas “levam em conta as sinergias e compensações entre os projetos.” (ROUSSEL, et. al., 1992, p. 36 – 37).
Operacionalmente, as políticas de financiamento são flexíveis, buscando suprir as todas as necessidades, mesmo excedendo a capacidade momentânea. A alocação de recursos em função do equilíbrio entre projetos e tecnologias nos negócios e as necessidades e oportunidades corporativas. Estabelece prioridades segundo a relação custo/benefício e as “contribuições para os objetivos comerciais e corporativos, por suas estruturas de tempo e pelos riscos associados”. A medição dos resultados é realizada pela comparação dos objetivos previstos, das expectativas tecnológicas e do estágio de desenvolvimento no momento. A avaliação do progresso é revisado sempre que eventos comerciais ou tecnológicos a justifiquem, sendo que neste caso os resultados são reavaliados. (ROUSSEL, et. al., 1992, p. 37 – 40).
No Quadro 3 estão resumidas as características da administração de P&D de terceira geração.
Quadro 3 – Características da administração de P&D de terceira geração (estratégica e intencional)
1 Contexto estratégico |
|
1.1 Filosofia |
|
1.2 Organização |
|
1.3 Estratégia de P&D/Tecnologia |
|
2 Princípios operacionais |
|
2.1 Financiamento |
|
2.2 Alocação de recursos |
|
2.3 Determinação de alvos |
|
2.4 Estabelecimento de prioridades |
|
2.5 Medição de resultados |
|
2.6 Avaliação de progresso |
|
Fonte: baseado em Roussel, et. al. (1992, p. 39).
Para Paez (2000, p. 68 - 69) a administração de P&D de quarta geração pode ser contextualizada e resumida do seguinte modo:
Identificada apenas por Rothwell (1992), apud Senker (1995), corresponderia a um processo de inovação dentro de um “modelo integrado”, no qual são mantidas equipes de P&D trabalhando simultaneamente, mas de forma integrada. Diferencia-se do anterior, na medida em que estabelece ligações com fornecedores primários bem específicos, mantém colaboração horizontal (como “joint ventures” e alianças estratégicas) e atende a clientelas diferenciadas no mercado. O pressuposto de um modelo de P&D linearmente seqüencial, com origens nos avanços científicos em direção de tecnologias (oferta) e destas para produção de bens e serviços, em atendimento às necessidades de mercados consumidores (demanda) ou, no sentido oposto, perde seu tradicional significado. Configura-se como um modelo de P&D sistêmico, com interações simultâneas entre componentes e estrategicamente delineadas.
Lyianage, Greenfield e Don (1999, apud LIMA et al, 2004, p. 92 – 93) apontam uma tendência à quarta geração com foco na gestão do conhecimento. Consideram ainda que a gestão de conhecimentos complementares, dependências tecnológicas e a transferência de conhecimentos entre as cadeias de pesquisa também são atividades de P&D.
Segundo Razuk, et. al. (2005, p. 4-5) na administração de P&D de quarta geração (sustentável) a organização de P&D se dá por meio de redes tecnológicas. A estratégia tecnológica é alinhada às estratégias de negócio, com visão de longo prazo e foco na sustentabilidade. A alocação dos recursos é baseada no balanceamento das prioridades e na relação risco/retorno do projeto. O acompanhamento e a mensuração dos projetos levam em conta os “impactos econômicos, sociais e ambientais, o atendimento aos objetivos do negócio, as expectativas do desenvolvimento tecnológico”.
Como filosofia as empresas de quarta geração consideram a P&D e a tecnologia como um importante instrumento da estratégia para competitividade de longo prazo, sendo que a P&D deve ser alocada onde o valor é criado e utilizado para bater no foco da inovação mundial. A produtividade de P&D deve ser aumentada pela utilização de diferentes instrumentos. (EDLER, et, al., 2002, p. 162).
Em relação à estratégia tecnológica corporativa, esta é explicitamente formulada e altamente integrada com a estratégia corporativa e das unidades de negócios. O elo de ligação e as pessoas estratégicas chave são membros da alta administração (Chief Executive Officer, Chief Technical Officer, etc.). (EDLER, et. al., 2002, p. 162).
Com relação à organização, existe uma necessidade de forte coordenação da centralização e de descentralização das atividades de P&D. A pesquisa deve ser alocada onde é necessária. Os vários elementos da cadeira de valor devem ser integrados. A P&D organizacional de uma companhia multi-divisional hoje e no futuro deve ser mundial. Centros de excelência com suas próprias responsabilidades e competências mundiais são estabelecidas e coordenadas como um portfólio de oportunidades. Redes tecnológicas horizontais ou verticais com parceiros externos são realizadas em áreas tecnológicas centrais da organização. (EDLER, et. al., 2002, p. 163).
Quanto à alocação de recursos, a propriedade do portfólio de P&D e os recursos são partilhados na corporação e nas unidades de negócios. Maior ênfase nas atividades de previsão tecnológica é necessária para manter a organização lado a lado com as novíssimas tecnologias e a fixação da agenda de pesquisa, ou seja, saber o que fazer (seleção e priorização de projetos) será o mais importante. (EDLER, et. al., 2002, p. 163).
No Quadro 4 estão resumidas as características da administração de P&D de quarta geração.
Quadro 4 – Bases da administração de P&D de quarta geração
Filosofia |
|
Estratégia |
|
Organização |
|
Alocação de recursos |
|
Fonte: baseado em Edler, et. al. (2002, p. 162).
Paez (2000, p. 69) indica ainda existência da administração de P&D de quinta geração que é resumida da seguinte forma:
Antevista também apenas por Rothwell (1992), apud Senker (1995), seria um modelo de sistemas integrados e em rede (“networking”), com as seguintes características: tendência de equipes paralelas de P&D trabalharem integradas; uso de sistemas especialistas e modelos de simulação de P&D; integração cooperativa, tanto as com fornecedores primários (a montante) como as no sentido horizontal (“joint ventures” e grupos colaborativos de pesquisa) e as situadas na comercialização de produtos inovadores (a jusante).
Entretanto, como não foram encontrados outros autores que abordassem de maneira consistente a quinta geração esta ainda não será abordada com mais profundidade, além do que em alguns pontos existem similaridades com a quarta geração, como por exemplo, a organização de P&D em redes, como citado por Razuk, et. al. (2005, p. 4-5).
Portanto, para que a quinta geração seja considerada a continuidade da administração de P&D é preciso que mais estudos sejam realizados e, principalmente, maiores evidências da quebra do paradigma anterior, a quarta geração.
Além das descrições apresentadas anteriormente, Razuk, et. al. (2005, p. 4-5) também fazem um resumo da evolução dos modelos de gestão tecnológica, segundo eles baseado em Roussel, et. al. (1992), conforme transcrito no Quadro 5.
Quadro 5 – Evolução dos modelos de gestão tecnológica
Descrição
|
Modelo de
1ª geração
|
Modelo de
2ª geração
|
Modelo de
3ª geração
|
Modelo de
4ª geração
|
Período
|
1960 - 1974
|
1975
– 1990
|
1990 - 1999
|
2000 -
|
Modo
|
Intuitivo
|
Sistemático
|
Estratégico
e intencional
|
Sustentável
|
Ênfase
|
Fomento
|
Rentabilidade
|
Rentabilidade
e crescimento
|
Rentabilidade,
crescimento, responsabilidade social e ambiental
|
Organização para P&D
|
Centralização
de
P&D
|
P&D centralizado e descentralizado nas áreas de negócio
|
Integração entre P&D corporativo e das áreas de negócio
|
P&D por Redes Tecnológicas
|
Estratégia tecnológica
|
Estratégia tecnológica não explícita
|
Transição para o alinhamento das estratégias tecnológicas às
estratégias de negócio
|
Forte alinhamento das estratégias tecnológicas às estratégias de
negócio, com foco na rentabilidade
|
Alinhamento
das estratégias tecnológicas às estratégias de negócio e espaço estratégico
para P&D de alto risco e alta recompensa, de mais longo prazo. Foco na
sustentabilidade e visão
de longo prazo
|
Ligação entre P&D e o
Planejamento Estratégico Corporativo
|
Sem ligação
|
Realimentação
não explícita.
Normalmente ocorre via conhecimento tácito
|
P&D
influencia o planejamento estratégico das áreas de negócio. Utilização de
roadmappings tecnológicos
|
P&D contribui para o planejamento estratégico corporativo, pela
construção de cenários tecnológicos de negócios e technological forecasting
|
Planejamento tecnológico
|
Capacitação e infra-estrutura
|
Planejamento, avaliação e controle de projetos
|
Planejamento estratégico da tecnologia, incorporando as análises de
maturidade tecnológica e de impacto
|
Planejamento estratégico da tecnologia incorporando as análises de
maturidade tecnológica e de impactos competitivo, social e ambiental
|
Alocação de recursos
|
Não há restrições de P&D. Não há um muito controle pela alta
gerência.
|
Os investimentos essenciais de P&D são definidos no nível
corporativo. Demais investimentos em P&D são definidos conjuntamente com
clientes e fornecedores.
|
Alocação de recursos é baseada no balanceamento das prioridades e na
relação risco/recompensa do projeto.
|
Alocação de recursos é baseada no balanceamento das prioridades e na
relação risco/recompensa do projeto.
|
Seleção e priorização de
projetos de P&D
|
Não existem prioridades estratégicas. As prioridades variam de acordo
com as necessidades operacionais.
|
Os programas e projetos essenciais de P&D são definidos no nível
corporativo. Demais programas e projetos em P&D são definidos
conjuntamente com clientes e fornecedores.
|
A seleção e a priorização dos projetos de P&D é feita de acordo
com a relação custo/benefício e a contribuição de cada projeto para a implantação
da estratégia de negócio.
|
A seleção e a priorização dos projetos é feita de acordo com os
princípios de sustentabilidade. Leva-se em conta qual serão seus impactos não apenas econômicos, mas
também social e ambiental e seu potencial de inovação.
|
Mensuração de resultados
|
A mensuração dos resultados é feita periodicamente de forma
superficial e mecânica.
|
O
resultado de inovações incrementais é medido quantitativamente.
Para as inovações radicais, o resultado é medido de acordo com o gap tecnológico em relação à concorrência.
|
Os resultados são medidos em relação aos objetivos de negócio e as
expectativas de desenvolvimento tecnológico
|
O acompanhamento e a mensuração dos projetos devem levar em conta seus
impactos econômicos, sociais e ambientais, o atendimento aos objetivos de
negócio, as expectativas do desenvolvimento tecnológico.
|
Fonte: Razuk, et. al. (2005, p. 4-5)
A partir deste resumo e dos pontos levantados junto à literatura, resumidos anteriormente, é possível traçar um paralelo entre as gerações da administração de P&D e identificar os principais pontos que diferenciam uma das outras.
Num primeiro momento é possível traçar uma linha do tempo, identificando os períodos de surgimento de cada geração da administração de P&D, segundo diversos autores, conforme demonstrado no Gráfico 1.
Gráfico 1 – Linha do tempo do surgimento das gerações da administração de P&D
Percebe-se a relativa coerência entre os autores com relação ao surgimento das gerações. As exceções são Coombs (1996, p. 348) indicando o surgimento da primeira geração em 1950, quando o provável, tendo em vista a posição dos outros autores, seria no final dos anos 50, e Razuk, et. al. (2005, p. 4) que indica o surgimento da segunda geração em 1975, enquanto outros indicam o final dos anos 60 e início dos anos 70 como início desta geração. Em Roussel, et. al. (1996) somente é indica uma data para o surgimento da primeira geração, abstendo-se de indicar datas para a segunda e a terceira geração. Neste livro os autores ainda não comentavam nada sobre a quarta geração da administração de P&D.
No contexto estratégico, a evolução vai desde a total desvinculação entre P&D e o planejamento estratégico corporativo (primeira geração) até a contribuição de P&D para a Administração Estratégica (quarta geração).
A filosofia que na primeira geração era da decisão das futuras tecnologias exclusivamente por P&D, passou pela decisão em parceria na terceira geração e chega a quarta geração com a consideração de que P&D e tecnologia são importantes instrumentos para a competitividade de longo prazo.
Em termos organizacionais, parte da centralização total (primeira geração), passa pela descentralização (segunda geração) e pela integração interna (terceira geração). Na quarta geração a integração se expande externamente pela atuação em redes tecnológicas.
As estratégias tecnológicas adotadas não eram explicitas (primeira geração). Passaram pelo alinhamento das estratégias tecnológicas às estratégias de negócio (segunda e terceira gerações). Culminaram no alinhamento das estratégias tecnológicas às estratégias de negócio com foco na sustentabilidade e na visão de longo prazo. A ênfase recai sobre a rentabilidade a partir da segunda geração, culminando na rentabilidade, crescimento e responsabilidade social e ambiental, que são fatores importantes para a sustentabilidade.
A compreensão da dimensão financeira partiu de apenas uma linha no orçamento anual (primeira geração) para uma determinação variável em função da maturidade tecnológica e o impacto competitivo (terceira geração).
A alocação dos recursos que era feita por P&D sem controle da alta gerencia (primeira geração) passou a ser balanceado em função das prioridades e na relação risco/recompensa de cada projeto (terceira e quarta geração), com ênfase na previsão tecnologia (quarta geração).
A inexistência de prioridades estratégicas de P&D (primeira geração) passa para a seleção e priorização de projetos em função dos princípios de sustentabilidade (quarta geração). A mensuração dos resultados realizada de forma mecânica e superficial (primeira geração) evolui para o acompanhamento e mensuração de projetos em função dos impactos econômicos, sociais e ambientais, além do atendimento aos objetivos do negócio e as expectativas do desenvolvimento tecnológico (quarta geração).
Dentro deste contexto, a transição da primeira até a quarta geração advém de um processo de transformação que permeia a mudança de todo o ambiente empresarial, principalmente no que tange a administração estratégica. Percebe-se nitidamente que a ótica dada aos recursos na primeira geração era a de uma sociedade empresarial com recursos disponíveis e, portanto, sem preocupações redobradas sobre a utilização desses recursos e o retorno gerado por ele. Em compensação, a ótica dada aos recursos na quarta geração se baseia na escassez dos mesmos, na necessidade de obtenção do máximo retorno possível pela aplicação deles e pela necessidade de que os mesmos gerem projetos ou atividades sustentáveis.
Como no Brasil a evolução técnica e científica via de regra se processa com certo delay em relação à países desenvolvidos, é provável que estudos investigativos venham a identificar a posição atual das empresas em relação a geração da administração de P&D e, principalmente, quais os motivos que levam as empresas a estarem em um ou outro nível.
Vol. 31 (4) 2010
[Índice]