Espacios. Vol. 37 (Nº 24) Año 2016. Pág. 3
Izabel Cristina de Souza CRUZ 1; Giovana Mira de ESPINDOLA 2; Eduilson Lívio Neves da Costa CARNEIRO 3
Recibido: 13/04/16 • Aprobado: 04/05/2016
3. Mapas de Uso da Terra e de Distribuição da População
RESUMO: Intervenções do Estado têm marcado significativamente a construção do espaço urbano em cidades médias brasileiras. Teresina é exemplo de cidade média do Nordeste que tem nas últimas décadas apresentado acelerado incremento demográfico, baseando suas políticas habitacionais em programas governamentais. Este trabalho tem por objetivo mapear a evolução espaço-temporal da mancha urbana de Teresina, estabelecendo suas relações com a distribuição espacial da população. Foram utilizados dados do Landsat 5 e 8 de 1990 a 2014, e dados do Censo Demográfico de 2010. Os resultados indicam elevadas taxas de expansão urbana e de concentração populacional em áreas periféricas da cidade. |
ABSTRACT: State interventions have significantly defined the construction of the urban space in the Brazilian medium cities. Teresina is an example of a medium city in the Northeast region that has shown in recent decades rapid population growth, basing its housing policies in government programs. This study aims to map the spatial and temporal evolution of the urban area in Teresina, establishing its relationships with the spatial distribution of the population. We used Landsat 5 and 8 data between 1990 and 2014, and data from the 2010 Demographic Census. The results indicate high rates of urban sprawl and population concentration in peripheral areas of the city. |
O crescimento urbano no Brasil teve início nas primeiras décadas do século XX, motivado principalmente pelos processos de industrialização dos grandes centros metropolitanos, e pelo decorrente êxodo rural. Nos anos de 1940, a população rural brasileira superava a população urbana, com 69% dos brasileiros vivendo no campo. Este quadro se inverteu ao longo das décadas de 1970 e 1980, tendo se consolidado antes na região Sudeste. Nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, onde a industrialização cresceu em ritmo lento e tardio, o crescimento urbano também se deu de forma mais lenta, visto que grandes massas migratórias rurais foram direcionadas aos centros urbanos consolidados da região Sudeste.
Dados do último Censo Demográfico, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2010, mostram que a população urbana do Brasil passou a representar 84% da população total, embora o desenvolvimento estrutural no país não tenha ocorrido nem de forma homogênea regionalmente e nem na mesma escala temporal (IBGE, 2013, 2014; Rodrigues & Veloso Filho, 2013).
No Nordeste, a expansão urbana tem aumentado significativamente desde as décadas de 1980 e 1990, e a região tem apresentado acelerado processo de urbanização, com elevadas taxas de crescimento demográfico, e uma hierarquização urbana regional interligada por importantes cidades médias (Marandola Jr & Modesto, 2012). A literatura recente considera cidades médias as aglomerações urbanas com população entre 100 mil e 1 milhão de habitantes, e aquelas que possuem localização privilegiada, considerando sua centralidade, e que exercem um poder sobre os sistemas regionais ou nacionais em que estão inseridas, funcionando como polo de desenvolvimento físico, social e econômico (United Nations, 2014; Wang, He, Liu, Zhuang, & Hong, 2012).
Em geral, nas cidades médias brasileiras, as tendências de concentração urbana e as altas taxas de densidade, largamente observadas nas cidades de grande porte, ainda não chegam a afetar de forma significativa a vida da população. No entanto, tais cidades têm apresentado graves dificuldades em atender as demandas por políticas públicas de gestão e de ordenamento territorial local (Brenner & Schmid, 2014; Smets & Salman, 2015).
Neste contexto, insere-se Teresina, cidade média nordestina que ao longo dos anos tem apresentado rápidas transformações em sua estrutura e fisionomia urbana, com mudanças substanciais de expansão e adensamento de sua malha. A cidade tem se destacado regionalmente pelas elevadas taxas de urbanização, com grande incremento econômico e populacional, além de ter se tornado centro político-administrativo do Estado e polo econômico da região. Teresina é a cidade mais populosa do estado do Piauí, e também a de maior produto interno bruto (PIB). Sua economia é baseada principalmente na área de serviços, como educação, saúde, comércio, eventos e lazer, e na indústria de construção civil, têxtil e de bebidas.
Partindo-se do uso de imagens orbitais dos satélites Landsat 5 e 8 coletadas entre 1990 e 2014, e de dados do Censo Demográfico do IBGE de 2010, o objetivo do presente trabalho é descrever e mapear temporalmente a evolução da mancha urbana da cidade, estabelecendo as relações deste crescimento horizontal com a distribuição espacial da população, discutindo ainda os processos históricos e as implicações sociais da concentração populacional na periferia da cidade.
Teresina, capital do estado do Piauí, situa-se num ponto estratégico, entre os Rios Parnaíba e Poti, a 05°05' de latitude sul e 42°48' de longitude oeste, pertencendo a mesorregião Centro-Norte Piauiense (Figura 1). O município apresenta clima tropical com dois períodos distintos: um quente e úmido, entre os meses de janeiro a julho; e outro quente e seco, entre os meses de agosto a dezembro. A vegetação da região apresenta exemplares de Caatinga, Mata de Cocais e Cerrado, encontrando-se com frequência palmeiras de babaçuais e carnaubais (Bartholomé & Belward, 2005). A cidade, fundada em 16 de agosto de 1852, foi idealizada pelo Conselheiro Saraiva, tendo como traçado geométrico a forma de tabuleiro de xadrez, tornando-se a primeira capital do Brasil com esta configuração (Reis Filho & Moura, 2014).
Figura 1: Localização geográfica do município de Teresina, Piauí, Brasil.
Entre 1970 e 1991, Teresina apresentou elevadas taxas de crescimento populacional, com valor médio de crescimento igual a 5,50% ao ano. A partir do levantamento e análise dos dados dos Censos Demográficos do IBGE de 1980 e 2010, observa-se que em 1980 a população de Teresina não chegava a 400.000 habitantes, e que em 2010 passou a 814.230 habitantes, sendo atualmente polo de processos migratórios da região. Teresina foi também a cidade do Nordeste onde a renda per capita mais cresceu entre os anos de 1970 e 2000, com taxa média de crescimento anual de 4,16% (IBGE, 2013).
Segundo a Secretaria Municipal de Planejamento e Coordenação da Prefeitura de Teresina, a área total do município totaliza 1.391,98 Km², sendo 17% da área considerada urbana e 83% rural. O perímetro urbano da cidade é atualmente dividido em regiões administrativas denominadas Superintendências de Desenvolvimento Urbano (SDU), nomeadas em Centro-Norte, Leste, Sudeste e Sul, e delimitadas segundo o estabelecido pela Lei N° 3.559, de 20 de outubro de 2006 (de Lima & Neto, 2006; Façanha & da Silva Viana, 2012; Melo & Bruna, 2009).
Faz-se necessário ressaltar que o limite do município tem se alterado ao longo dos anos devido à emancipação ou a incorporação de territórios vizinhos, no entanto, neste trabalho, o aspecto temporal da expansão urbana da cidade foi referenciado ao limite municipal de 2013 (Figura 1), que inclui toda a zona urbana e rural da cidade. Desta forma, o foco principal das análises foi o perímetro urbano constituído e o incremento da mancha urbanizada nas SDU's.
Figura 2: Incremento populacional nas regiões administrativas
de Teresina entre 1991 e 2012: valores de habitantes por cada SDU.
Na Figura 2 é possível constatar que a taxa de crescimento populacional da cidade foi mantida praticamente constante nas regiões administrativas, tendo sido a zona Leste a região que apresentou um incremento levemente mais acelerado. Esta zona apresenta grandes potencialidades de comércio, serviços e educação, e também um grande atrativo de moradia por possuir o status de região nobre da cidade. Por outro lado, o grande quantitativo populacional da zona Sul se deve principalmente aos programas habitacionais do governo federal, que incentivaram a ocupação das áreas mais afastadas do centro a fim de oferecer habitações de baixo custo.
No desenvolvimento deste trabalho foram utilizadas imagens ortorretificadas dos satélites Landsat 5 e Landsat 8 obtidas gratuitamente pelo site do U. S. Geological Survey (USGS). O Landsat 5 é considerado um satélite da classe multiespectral e de média resolução espacial, com revisita da mesma área a cada 16 dias, percorrendo uma órbita polar circular e heliossíncrona a uma altitude de 705 km e uma inclinação de 98,2º. O satélite está inativo desde novembro de 2011, no entanto, seu acervo de imagens encontra-se disponível de forma gratuita. O satélite Landsat 5 traz a bordo o sensor TM, que coleta imagens que cobrem no terreno uma área projetada de 185 x 185 km, com resolução radiométrica de 8 bits. Com características semelhantes, o Landsat 8 entrou em operação em 2013 com vistas a substituir seus antecessores, e passou a disponibilizar imagens gratuitas a partir do segundo semestre deste mesmo ano. O sensor OLI a bordo do satélite Landsat 8 coleta imagens com uma resolução radiométrica de 12 bits e largura das cenas também de 185 km x 185 km (Markham, Storey, & Morfitt, 2015; Wulder, Masek, Cohen, Loveland, & Woodcock, 2012).
Desta forma, as imagens utilizadas no presente trabalho foram adquiridas em formato multiespectral nas bandas 1, 2, 3, 4, 5 e 7 para o satélite Landsat 5 TM nos anos de 1990 (18/09/1990) e 2000 (28/08/2000); e nas bandas 2, 3, 4, 5, 6, e 7 para o satélite Landsat 8 OLI no ano de 2014 (19/08/2014), todas elas referentes ao recorte geográfico das órbitas-ponto 219/63 e 219/64.
Todas as imagens utilizadas apresentam resolução espacial de 30 m nas bandas multiespectrais que cobrem o intervalo espectral do visível, infravermelho próximo e infravermelho médio (Markham et al., 2015). Para este trabalho foram selecionadas imagens com a menor cobertura de nuvens disponíveis no período de seca. A primeira etapa consistiu na criação do mosaico e do recorte das imagens das diferentes datas de acordo com a área de estudo estabelecida (Figura 1). Em seguida, foram realizadas as etapas de definição dos alvos de interesse e posterior classificação das imagens pelo método supervisionado. Assim, partiu-se do mapeamento dos usos da terra como forma de representação cartográfica do território urbano.
Com base na interpretação visual da composição colorida falsa-cor, foram identificadas as classes temáticas de interesse para a análise da expansão da mancha urbana da cidade de Teresina, tendo-se chegado às seguintes classes: Corpos D'água, Mancha Urbana, Solo Exposto, Vegetação Densa e Vegetação Mosaico. O mapeamento de tais classes temáticas foi realizado por classificação digital supervisionada pelo algoritmo de Máxima Verossimilhança (MAXVER) implementado no software SPRING (Câmara, Monteiro, Fucks, & Carvalho, 2002; Câmara, Souza, Freitas, & Garrido, 1996; Longley, Goodchild, Maguire, & Rhind, 2001), e para tanto, foram coletadas curvas espectrais dos alvos representativos de cada classe.
As curvas espectrais dos alvos selecionados representativos das classes temáticas são apresentadas na Figura 3. Visualmente, percebe-se a discriminação entre cada classe analisada, dado que as curvas apresentam comportamento espectral característico, permitindo a separabilidade das mesmas no processamento da classificação digital.
Figura 3: Curvas espectrais dos alvos de interesse: Corpos D'água,
Mancha Urbana, Solo Exposto, Vegetação Densa e Vegetação Mosaico
O algoritmo MAXVER é recomendado para um processo de classificação de imagens baseado em pixels, com vistas a medir a ponderação das distâncias entre médias dos níveis de cinza das classes consideradas, utilizando-se para tanto parâmetros estatísticos (Jensen, 2007; Richards, 2012). O algoritmo requer também a interação do usuário por meio do treinamento e seleção de amostras das classes temáticas de interesse. Após a classificação, foi executado um processo de pós-classificação com a finalidade de se eliminar possíveis ruídos na imagem, agregando pixels soltos. Os pixels soltos são extraídos em função de um peso e limiar fornecidos pelo usuário. No caso desse estudo, foi utilizado peso 2 e limiar 5. As imagens pós-classificadas de cada data foram então usadas na geração dos mapas temáticos de uso da terra para os anos de 1990, 2000 e 2014.
Além de fornecer mapas temporais da classe Manha Urbana em Teresina, este trabalho procura investigar e construir mapas derivados destes usos. Isto porque, o importante nesta discussão é também mostrar que a expansão urbana de Teresina não tem sido acompanhada por uma distribuição equitativa dos investimentos em infraestrutura e do acesso da população aos serviços urbanos básicos
Para fins de comparação, é interessante distinguir duas partes principais da cidade de Teresina: uma relativa aos bairros mais centrais, e outra compreendendo o restante dos bairros, comumente denominada periferia. Neste trabalho, a periferia pode ser genericamente identificada como regiões distantes do centro da cidade, onde a renda familiar das populações residentes é inferior à renda dos bairros centrais, e onde se encontram os piores níveis de serviços urbanos básicos.
Este trabalho apresenta também uma proposta metodológica para a espacialização da população na mancha urbana de Teresina mapeada em 2014, tornando possível uma visão não apenas estrutural da cidade, mas também uma visão sistêmica da segregação de suas áreas periféricas, considerando como fator de segregação a densidade populacional. Isso porque, os dados de população do Censo Demográfico de 2010 estão disponíveis apenas no nível de agregação dos setores censitários (unidade mínima deste censo). Nas regiões centrais da cidade o tamanho médio dos setores censitário até é adequado ao nível de concentração da população, no entanto, nas áreas periféricas, estes setores censitários acabam se tornando muito maiores em abrangência geográfica, cobrindo inclusive áreas não urbanizadas, e desta forma, mascarando a real concentração populacional.
Assim, tendo-se como base o mapa de uso da terra de 2014, foi gerado um parâmetro espacial da estimativa da distribuição espacial da população, utilizando como entrada os dados do quantitativo da população agregada nos setores censitários considerados no Censo Demográfico do IBGE de 2010 (IBGE, 2013). Para o cálculo deste parâmetro foi selecionada a categoria temática da Mancha Urbana mapeada em 2014. Posteriormente, a área de estudo foi então dividida em 22.899 células regulares com resolução de 250 m x 250 m (6,25 ha).
O processamento da estimativa da distribuição espacial da população foi realizado no software TerraView (Câmara et al., 2008), utilizando-se o pacote aRT do projeto R (Andrade & Ribeiro, 2005; de Espindola, de Aguiar, & de Andrade, 2012). Os dados do quantitativo da população foram combinados aos dados do mapa temático, permitindo a espacialização da população apenas nas áreas urbanas. Os dados do Censo Demográfico, agregados por setor censitário, foram incorporados nas células por meio da ponderação do quantitativo da classe Mancha Urbana em cada célula e a densidade populacional de cada setor censitário. Como resultado, cada célula da área de estudo possui uma estimativa do seu quantitativo de população (de Espindola et al., 2012).
Ao longo dos anos de 1990 a 2014, a cidade de Teresina apresentou altas taxas de expansão urbana e elevados valores de incremento populacional. Os resultados do trabalho permitem descrever como se deu esta evolução, partindo-se de 1990 quando a classe temática da Mancha Urbana representava 3% (4.365,09 ha) da área do município, passando por 2000 com a Mancha Urbana contabilizando 6% (8.475,30 ha) da área, até 2014 quando passou a representar 8% (11.590,02 ha) da área total do município (Figura 4 e Tabela 1).
Neste período houve uma homogeneização no eixo Norte – Sul da cidade e um crescimento significativo da zona Leste, sendo notoriamente a região que mais cresceu neste intervalo de tempo praticamente dobrando de tamanho. A dinâmica do crescimento urbano, influenciado principalmente pelo crescimento da população e da economia, indicam uma expansão urbana mais acentuada entre os anos 1990 e 2000, e uma desaceleração no crescimento em relação aos anos 2000 e 2014. Já a população cresceu em um ritmo bem mais lento em todos os anos, porém apresentando um crescimento mais acentuado entre os anos 2000 e 2014 em relação aos anos 1990 e 2000 (Tabela 1).
Retrospectivamente, os anos anteriores a 1990 foram marcados pelo aparecimento de Conjuntos Habitacionais construídos por programas do governo federal como a COHAB (Companhia de Habitação) e o Programa de Cidades de Porte Médio. Estes conjuntos definiram um novo formato da cidade de Teresina por meio de um movimento em direção a periferia e da afirmação das tendências de crescimento urbano horizontal, principalmente na zona Sul a partir da construção do Conjunto Parque Piauí em 1968. A partir de 1988, com uma nova abordagem da política federal urbana baseada na nova Constituição, foram definidos marcos legais da regularização fundiária e da política de habitação social com o estabelecimento do conhecido Estatuto das Cidades que propõe a implantação da Política Nacional de Habitação.
Na década que antecede o ano de 2000, houve uma redução nos investimentos em infraestrutura urbana e no setor habitacional por parte do governo federal, em parte motivado pelos baixos índices de crescimento econômico do país. Em Teresina este processo resultou no início da favelização da cidade, pois o movimento de pessoas em busca de moradia se manteve enquanto a oferta de habitações populares reduziu.
Em meados do ano 2000 ocorreu a implantação do projeto SANEAR, que ampliou o sistema de esgotamento sanitário da zona Leste, permitindo a construção de grandes edifícios nesta região. Juntamente com o surgimento de dois centros comerciais de grande importância para a cidade, o Shopping Riverside e o Teresina Shopping, o crescimento vertical da zona Leste foi favorecido, resultando no aparecimento de uma segregação sócio espacial evidente. Nos anos seguintes ao ano de 2000, os programas de habitações populares retornam, e a economia da cidade começa a chamar a atenção novamente da população rural, e de outros municípios que buscam na capital a oportunidade de sair do campo e obter melhores condições de moradia e estudo.
Figura 4: Evolução da classe temática Mancha Urbana nos anos de 1990, 2000 e 2014.
Em termos de concentração populacional, a análise da Figura 5 permite constatar que a distribuição da população na mancha urbana de Teresina não é homogênea e que grande parte da população está concentrada em áreas periféricas. Apesar de em 2014 Teresina ter apresentado uma densidade demográfica média de 72,53 hab/ha (Tabela 1), pode-se constatar pela análise da Figura 5 que existem locais onde esta densidade chega a intervalos muito maiores, com valores variando entre 160 a 728 hab/ha (1001 – 4548 hab/6,25 ha), limites estes bem acima do padrão de 100 hab/ha estabelecido pelo I Plano Estrutural de Teresina de 1978.
Percebem-se áreas com altas densidades populacionais, principalmente na porção norte da zona Centro-Norte e nas zonas Sul e Sudeste. Dentre as regiões mais populosas da cidade, serão analisados a seguir os processos históricos de consolidação destas regiões nas zonas Sul, Sudeste e Centro-Norte. Por outro lado, existem áreas centrais da cidade que não são efetivamente ocupadas por residências, apresentando baixa densidade populacional. São estes os casos do bairro Centro e da porção central da zona Leste da cidade. A atual segregação sócio espacial de Teresina foi construída por um longo processo de exclusão das famílias de baixa renda das áreas centrais e mais valorizadas. Assim, constata-se que tal situação é decorrente principalmente do processo histórico de ocupação da cidade, pautado em investimentos estimulados por programas de governo.
Tabela 1: Evolução das áreas da classe temática Mancha Urbana,
dos quantitativos demográficos e da densidade calculada.
Ano |
Mancha Urbana (ha) |
Total População |
Densidade (hab/ha) |
1990 |
4365,09 |
599272 |
137,29 |
2000 |
8475,30 |
715360 |
84,41 |
2014 |
11590,02 |
840600 |
72,53 |
Na zona Sul, o Conjunto Parque Piauí foi ampliado em 1977, tornando-se mais tarde o bairro Parque Piauí que chegou a ser o mais populoso da cidade. Já na década de 1980, foram construídos os Conjuntos Promorar e o Raimundo Portela neste mesma zona. Atualmente, o bairro mais populoso da zona Sul é o Angelim, que engloba o Residencial João Paulo II, Residencial Mario Covas, Residencial Betinho, Parque Eliana e Loteamento 7 Estrelas, construídos entre as décadas de 1990 e 2000.
Em 1977, a zona Sudeste de Teresina recebeu a construção do maior conjunto habitacional da cidade, o Conjunto Dirceu Arcoverde I. Em 1980, houve a ampliação deste conjunto com a criação do Dirceu Arcoverde II, ambos construídos pela COHAB. Atualmente, a zona Sudeste engloba os conjuntos habitacionais Parque Itararé, Conjunto Dirceu Arcoverde I, Conjunto Dirceu Arcoverde II e Conjunto Parque Boa Esperança, sendo o bairro Itararé o mais populoso da cidade, com uma população de 37.443 habitantes em 2010.
Figura 5: Estimativa da distribuição espacial da população em 2010-2014.
Por volta do ano 1982 foi criado o conjunto José Francisco de Almeida Neto na zona Centro-Norte da cidade, que mais tarde se tornou o Bairro Mocambinho, e que atualmente engloba os conjuntos habitacionais Mocambinho I, Mocambinho II, Mocambinho III, Residencial Poty – Moca, Residencial São José e Conjunto Santa Sofia. Ao final da década de 1980, terras ao extremo norte da mancha urbana de Teresina são compradas pelo governo visando a implantação do polo industrial Companhia de Desenvolvimento Industrial do Piauí (CODIPI). Como tal iniciativa não foi implementada, famílias de baixa renda começaram a ocupar a região. Em 2009 foram iniciadas as obras do Conjunto Habitacional Jacinta Andrade com 4.300 unidades habitacionais, com verbas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal.
Ou seja, ações de governo tem historicamente priorizado o assentamento de famílias de baixa renda em áreas periféricas da cidade, assim, excluindo estas famílias do acesso aos equipamentos urbanos da cidade, e gerando fluxos diários contínuo de locomoção destas famílias para áreas centrais da cidade onde estão concentrados os principais serviços de saúde e educação.
O problema do uso e ocupação do solo urbano em Teresina, caracterizado pela disposição por uma parcela significativa da população em áreas periféricas, vem desde a criação da cidade. Os aglomerados residenciais criados por diferentes inciativas governamentais ou por ocupações irregulares sempre foram carentes de infraestrutura urbana. Com base nos resultados do trabalho, verificou-se que grande parte da população da cidade encontra-se instalada em áreas periféricas, o que tem contribuído para a marginalização desta população. Por outro lado, a distribuição espacial da densidade urbana na cidade também varia consideravelmente, e tem desafiado os planos de desenvolvimento sustentável para a cidade e sua população. Mesmo a legislação municipal tratando de padrões de densidade urbana por zonas da cidade, os mapas apresentados mostram que os valores de densidade variam localmente, tornando necessária uma discussão mais ampla e abrangente sobre o futuro da cidade.
De forma geral, os fatores que dificultam o acesso à moradia das famílias de baixa renda são o próprio mercado imobiliário da cidade, o baixo poder aquisitivo destas populações, a desarticulação das esferas de governo, e a descontinuidade das politicas públicas voltadas para a habitação. Ou seja, o atual modelo de expansão horizontal dificulta a implantação de infraestrutura, penalizando a população mais pobre e indiretamente beneficiando a especulação imobiliária pela valorização de lotes vazios em áreas centrais e com boa qualidade de infraestrutura.
Além disto, as tendências de urbanização de Teresina mostram que a expansão urbana sem um necessário planejamento tem criado problemas relacionados com a ocupação de importantes áreas de sistemas ambientais, como a região do encontro dos Rios Parnaíba e Poti. Desenvolvimento urbano sustentável é uma meta difícil de ser alcançada por municípios com baixo desenvolvimento econômico. Depois de décadas de produção do espaço urbano com pouca preocupação sobre seus recursos naturais, é ainda mais difícil reorganizar as áreas urbanizadas para manter o valor das condições ambientais. É um desafio constante acomodar um contingente crescente da população urbana, suprindo as infraestruturas e serviços públicos, e ainda perseguindo uma qualidade ambiental por meio de uma densidade que dê suporte aos ideais de qualidade e sustentabilidade.
Com base nessas conclusões, faz-se necessário expor algumas recomendações relativas aos programas de habitação e de infraestrutura urbana que deverão nortear uma discussão mais abrangente sobre o futuro da cidade. Tais recomendações são:
1. Os programas habitacionais devem priorizar locais com infraestrutura já disponível, principalmente com relação as redes de transporte e de saneamento; e também modelo vertical das habitações.
2. Ações do governo municipal devem priorizar a reocupação residencial no centro comercial da cidade, viabilizando uma utilização eficiente de uma infraestrutura já implantada, assim como, priorizar a integração urbanística das áreas habitadas e mais populosas da cidade.
3. No âmbito ambiental, as ações do governo devem priorizar o remanejamento de domicílios localizados em áreas de risco ambiental em toda a extensão dos Rios Parnaíba e Poti e em áreas susceptíveis a enchentes.
Portanto, faz-se necessária a integração de ações de políticas urbanas nas diversas esferas setoriais públicas e privadas, de modo a minimizar a distribuição desigual no espaço urbano de equipamento sociais e de infraestrutura, e contribuindo para um controle intensivo, participativo e consciente do desenvolvimento da cidade.
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1. Universidade Federal do Piauí (UFPI), Centro de Tecnologia, Departamento de Transportes, Teresina, Piauí, Brasil. e-mail: izabel.scruz@hotmail.com
2. Universidade Federal do Piauí (UFPI), Centro de Tecnologia, Departamento de Transportes, Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/TROPEN), Teresina, Piauí, Brasil. e-mail: giovanamira@ufpi.edu.br
3. Instituto Federal do Piauí (IFPI), Campus Teresina Central, Departamento de Informação, Ambiente, Saúde e Produção Alimentícia, Teresina, Piauí, Brasil. e-mail: eduilson@ifpi.edu.br