Espacios. Vol. 34 (8) 2013. Pág. 7 |
Gestão da Mudança para um Sistema de Produção Enxuta: estado da arte e direções de pesquisaChange Management for Lean Production System: state of the art and research directionsGuilherme Luz TORTORELLA 1 y Flávio Sanson FOGLIATTO 2 Recibido: 18-05-2013 - Aprobado: 12-07-2013 |
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RESUMO: |
ABSTRACT: |
1. IntroduçãoDurante as últimas duas décadas, pressões competitivas têm forçado organizações nos Estados Unidos e Europa a reestruturar seus sistemas produtivos de modo a tornarem-se mais flexíveis e inovadoras (POLLITT, 2006). Contudo, menos de 20% dessas organizações obtiveram sucesso no processo de mudança de seus sistemas produtivos (LUCEY et al., 2005). Por outro lado, países como o Japão, têm apresentado um crescimento econômico significativo nas últimas décadas, ocasionado por indústrias de eletrônicos, máquinas, automotiva e até mesmo aeroespacial (SIM; ROGERS, 2009). O motivo pelo qual algumas indústrias japonesas têm se destacado pode ser atribuído às características do sistema produtivo que possuem: o sistema de produção enxuta (SPE) (LIKER, 2005). A principal meta na implementação de um SPE é aumentar produtividade, melhorar qualidade, diminuir lead times produtivos e reduzir o custo. Esses são os fatores que indicam o nível de desempenho de um sistema de produção enxuta. Os determinantes desse sistema de produção são as ações tomadas, os princípios implementados e as mudanças realizadas na organização para atingir o desempenho objetivado (MCALLASTER, 2004). Gerenciar mudanças é extremamente relevante para empresas; entretanto, dificuldades no gerenciamento de processos de mudança faz com que suas taxas de sucesso variem entre 20 e 30%. Um processo de mudança bem sucedido exige um gerenciamento adequado, o qual envolva não apenas um gerente carismático, mas também um alinhamento dos propósitos individuais com a iniciativa de mudança (BOX; PLATTS, 2005). Neste artigo, apresenta-se o estado da arte da literatura sobre gestão da mudança para um SPE. O principal objetivo é prover uma estrutura que permita a análise e compreensão dos diversos, ainda que relativamente restritos em número, desenvolvimentos em relação ao tema reportados na literatura nos últimos anos. Além disso, propõem-se direcionamentos para pesquisas futuras sobre o tema, com base em seu atual estado da arte. O artigo apresenta uma importante contribuição para pesquisas sobre SPE ao associar a sua implantação prática à princípios de gestão da mudança, normalmente encontrados na literatura sobre enfoques distintos do SPE. A medida que empresas progressivamente direcionam seus esforços para a adoção de práticas enxutas de produção, a sistematização desse processo através de princípios de gestão da mudança mostra-se relevante e necessária. De forma análoga, o estabelecimento de uma agenda de pesquisa sobre SPE que investigue a sua intersecção com a gestão de mudanças provê um sólido suporte teórico para um assunto com evidente impacto prático, mas usualmente tratado de forma superficial na literatura. 2. Habilitadores da implementação de um SPEApesar do SPE não ser um conceito novo, poucas organizações foram capazes de explorar plenamente a filosofia que permeia técnicas enxutas já conhecidas (LEITNER, 2005). Harvey (2004) e Araújo e Rentes (2005) comentam que, apesar de muitas empresas de diversos setores terem alcançado benefícios significativos com a adoção dos conceitos do SPE, muitos gerentes frustram-se ao tentar implantar partes isoladas de um sistema enxuto sem entender o todo. Assim, não só o conhecimento das técnicas, mas a sua forma de implantação, são aspectos críticos de um sistema em transição. Achanga et al. (2006) identificaram 3 fatores necessários para a implantação de um SPE: (i) liderança e visão estratégica de gestão; (ii) cultura da organização e (iii) habilidades e conhecimento. 2.1 Liderança e visão estratégica de gestãoDevido ao aumento da competição entre empresas e o acelerado passo da mudança organizacional e tecnológica, o conceito de gestão também está mudando. O foco gerencial, antes na manutenção das operações ordinárias, passa a ser centrado no gerenciamento das inovações, de forma a promover a implantação bem sucedida de novas e efetivas práticas, estruturas e sistemas. Para tanto, uma abordagem diferenciada deve ser utilizada na gestão da mudança. Esta tem que ser iniciada a partir de uma visão estratégica gerencial, porém focada no encorajamento da inovação e no aprendizado bottom-up (FERRO, 2004). Achanga et al. (2006) colocam que um processo de mudança, como o proposto por um SPE, deve ser planejado e envolver os membros da gerência e diretoria das organizações. Tal envolvimento gera o comprometimento da alta gerência, o qual é um dos principais pré-requisitos para promover a mudança almejada. Segundo Koenigsaecker (2005), a gestão da mudança não deve ser delegada ao nível intermediário na hierarquia da organização, uma vez que o exemplo é um dos principais meios de liderança. Potthoff (2004) cita quatro práticas fundamentais no papel das lideranças:
Koenigsaecker (2005) coloca que uma falha comum das lideranças em uma transformação enxuta é a falta de entendimento do que é realmente atingível com o sistema enxuto. Dentre os principais fatores de um aprendizado enxuto, o mais difícil e demorado na construção de uma organização verdadeiramente enxuta envolve a mudança de comportamento das lideranças. Os líderes devem ser os primeiros a iniciar o processo de aprendizado, pois, do contrário, não terão o conhecimento necessário para guiar uma transformação enxuta (MOTWANI, 2003). O ingrediente básico que possibilita a uma empresa iniciar o processo de mudança enxuta é o foco. Um foco comum, iniciado pela alta administração e posteriormente estendido a todas as pessoas em todos os níveis da organização, assegura que as decisões operacionais sejam coerentes. Uma empresa que busca a mudança enxuta deve ter metas claras e consistentes, alinhadas com esse foco organizacional (NELSON, 2004). Tal alinhamento ocorre quando as pessoas entendem e são capazes de participar da estratégia da organização (GAGNON; MICHAEL, 2003). Waurzyniak (2004) relata a jornada da empresa Arvin Meritor na trajetória de mudança para um sistema enxuto e salienta que, uma vez decidido iniciar o processo, o sistema foi implementado de forma top-down, no qual os funcionários levaram algum tempo para se adequar ao novo modo de trabalho. 2.2 Cultura da organizaçãoPessoas de diferentes nações têm diferentes valores ou normas que influenciam suas atitudes e prioridades em assuntos relevantes às organizações. As organizações também possuem culturas diferentes; contudo, estas diferem em um nível de práticas, símbolos, heróis e rituais. A transição para um ambiente enxuto depende mais da mudança de cultura na organização do que da adoção de técnicas específicas de manufatura e processo (SAWHNEY; CHASON, 2005). O advento de mudanças fundamentais nos processos produtivos em direção à manufatura enxuta coincide com um período de transição no campo de gestão de pessoas. Essa transição tem implicação na estrutura organizacional das empresas, criando estruturas planas focadas em processos e não em hierarquias. Assim, a menos que os departamentos reconheçam e entendam as mudanças culturais que os afetam, em ambas as bases intra e interdepartamentais, as resistências à mudança irão limitar ou até mesmo inviabilizar os processos enxutos (SAWHNEY; CHASON, 2005). Shah e Ward (2003) afirmam que, em geral, o sucesso na implantação de qualquer prática específica de gestão frequentemente depende das características da organização, e que nem todas as organizações podem ou devem implantar um mesmo grupo de práticas. Assim, a aplicação das diversas técnicas contidas em um SPE deve ser entendida sob o contexto cultural no qual são desenvolvidas. O SPE, em termos culturais, é a completa antítese da maioria dos ambientes atuais, demandando o desenvolvimento de um número de políticas inter-relacionadas cobrindo virtualmente cada aspecto pessoal e técnico. Assim, a criação de uma cultura organizacional de suporte é uma plataforma essencial para a implantação de um sistema de produção enxuta (ACHANGA et al., 2006). Mehta e Shah (2005) comentam que o SPE busca criar uma cultura de comprometimento recíproco entre funcionário e empresa e escolhe investir em melhores relações de trabalho como uma contramedida a alta padronização e um modo de controle sistematizado. Liker e Meier (2005) acrescentam que, como em qualquer família japonesa, a meta no ambiente corporativo é atingir a harmonia no grupo. A individualidade de seus membros é secundária e espera-se que todos contribuam para as decisões a serem tomadas. Assim, desenvolve-se neste ambiente um indivíduo altamente disciplinado e comprometido com o propósito do grupo. Este indivíduo é medido, não por seus atributos pessoais, mas pelo nível de sua contribuição para o grupo. Ao iniciar a adoção do SPE em grandes companhias com fortes valores, como Shell, Siemens e DaimlerChrysler, por exemplo, deve-se estar ciente dos modelos mentais que direcionam o comportamento da organização. Tal entendimento da companhia permite que as tradições sejam vistas como mais do que apenas um obstáculo à mudança, mas como um fator contextual que catalise sua implementação (STADLER; HINTERHUBER, 2005). Conti et al. (2006) realizaram estudo para verificar os níveis de estresse e de comprometimento dos funcionários durante a jornada de mudança para um SPE. Os resultados demonstraram que à medida que os funcionários são envolvidos em atividades de melhoria contínua e seu entendimento sobre seus benefícios aumenta, o comprometimento tende a aumentar. Contudo, este, inicialmente, sofre uma queda que deve ser corretamente gerenciada pela empresa a fim de não afetar o negócio. Isto se deve basicamente pelo receio de que as técnicas sejam implementadas com intuito de redução de quadro operacional ou fatores que possam prejudicar os funcionários. 2.3 Habilidades e conhecimentoEducação e treinamento são claramente as fundações de qualquer iniciativa de mudança, sem as quais uma organização encontrará diversos problemas na implantação de mudanças. Round (2003) comenta que as organizações devem investir recursos e tempo da gerência para treinar e desenvolver seus funcionários em habilidades que lhes sejam úteis nas novas tarefas exigidas durante o processo de mudança. De acordo com Box e Platts (2005), uma organização que aprende é aquela que consegue de forma consistente sustentar a inovação ou aprendizado com metas diretamente ligadas a melhorias de qualidade, produtividade ou eficiência operacional a fim de sustentar ou aumentar a lucratividade do negócio. Contudo, os aspectos de aprendizado organizacional não são enfatizados na literatura voltada para sistemas de produção enxuta (PETTERSEN, 2009). Um exemplo disso foi a implementação do sistema de produção enxuta na Arvin Meritor. Diferentemente de outras iniciativas relacionadas ao SPE, a empresa não buscou consultores ou professores externos, mas apostou no desenvolvimento de líderes internos como disseminadores da mentalidade enxuta através de treinamentos com os funcionários (WAURZYNIAK, 2005). Para Pettersen (2009), o processo produtivo é tratado como um laboratório, onde o desenvolvimento de produtos é constante e novas técnicas de processo são sistematicamente introduzidas. As empresas não são entidades estáticas, mas mudam e evoluem continuamente. Treville e Antonakis (2006) comentam que no Sistema Toyota de Produção os funcionários são providos de equipamentos e encorajados a ajudar a melhorar o sistema produtivo. Além disso, são treinados em outras funções a fim de substituir colegas de trabalho que se encontram ausentes e, assim, não parar a linha de produção. Contudo, mais importante que a multifuncionalidade de seus operadores é o comprometimento com a melhoria e qualidade de seus produtos e processos. Portanto, um fator chave para a Toyota é um subsistema referido como “respeito pelas pessoas”, o qual incorporava um programa de sugestões e comunicação, com base na expansão do conhecimento e habilidade requeridos de seus funcionários na resolução de problemas. Outra questão importante é a capacidade de aprendizado com as falhas que ocorrem ao longo do processo de aprendizado e implementação de novas abordagens de produção. Mortimer (2006) relata o caso da Siemens em Congleton, Inglaterra. Nesse, comenta que após a implementação de mudanças na forma como o sistema produtivo era gerenciado, notava-se uma queda inicial no desempenho das equipes envolvidas e, com isso, um forte desejo de se voltar a trabalhar na forma anterior à mudança. O autor relaciona essa queda com a velocidade com que as equipes se adaptavam e aprendiam a nova forma de trabalho. Contudo, uma vez superada a etapa de aprendizado, a equipe aos poucos passava a perceber as vantagens da nova abordagem. Brito (2004) coloca que o ser humano apreende o conhecimento com o acúmulo de acertos e erros; se existe o medo de errar, a possibilidade de acertar também é restrita. Na Toyota, por exemplo, os funcionários são encorajados a criar, ter uma visão de longo prazo e tomar decisões bem avaliadas. Além disso, Minoura (2003) coloca que para manter o surgimento de novas técnicas revolucionárias de produção é preciso desenvolver idéias e conhecimentos singulares através do processo de aprendizado e experimentação. Isso significa que há necessidade de se pensar sobre como podemos desenvolver pessoas que possam gerar estas idéias e manter o processo inovativo. 3. Gestão da mudança para um SPEA seleção das ferramentas e técnicas apropriadas para melhoria dos processos, junto a sua aplicabilidade, incorporação e aceitação nas operações, é um grande problema para muitas companhias (HERRON; BRAIDEN, 2006). Bhasin e Burcher (2006) comentam que, geralmente, as empresas iniciam seu processo de mudança utilizando uma ou duas técnicas enxutas e as implementam através de toda a empresa. Contudo, percebem que isto não acarreta em uma melhoria do fluxo de valor da empresa. O problema é que são diversas as ferramentas enxutas existentes (mais de 100, segundo Pavnascar et al., 2003) e estas devem ser aplicadas simultaneamente em pontos onde haja maior necessidade e possibilite um maior impacto no bottom line da empresa. Thilmany (2005) comenta que as organizações tipicamente começam a implantação de técnicas enxutas no chão-de-fábrica. Contudo, o processo manufatureiro não começa realmente no chão-de-fábrica; este é influenciado por diversas áreas de suporte como, por exemplo, engenharia, financeiro e vendas. Assim, implementar a filosofia enxuta e suas técnicas requer a adoção de um sistema inteiro de um modo holístico, e não apenas a aplicação de técnicas isoladas de maneira pontual (CRUTE et al., 2003). O Lean Enterprise Institute – LEI (2010) propõe um roadmap para auxílio no estabelecimento de uma seqüência de treinamento a fim de desenvolver, junto aos indivíduos das organizações, os princípios do pensamento enxuto. Este guia, conforme pode ser visto na Figura 1, salienta que todos os processos de formação devem iniciar pelo Mapeamento de Fluxo de Valor de modo a se evitar o erro comum da aplicação das técnicas isoladas, ao invés da criação de um sistema que construa um fluxo de valor enxuto. Apesar de não ressaltar a importância de se avaliar o nível de implementação do SPE, apresenta um currículo flexível e permite uma espécie de customização de acordo com o ambiente de aplicação e estágio de mudança enxuta no qual a organização se encontra (SILVA, 2008). O Productivity Inc. (2010) apresenta um modelo de guia para a implementação de um SPE dividido em cinco fases. Inicialmente, na fase de planejamento, faz-se a avaliação da situação corrente e definição dos objetivos e formas de medi-los ao longo do processo de mudança. Em seguida, na fase de aplicação piloto, escolhem-se pontos do fluxo de valor para direcionar a aplicação de técnicas enxutas visando sedimentação da nova cultura. Após, na fase de desdobramento para toda planta, elabora-se plano para replicar para demais áreas as melhorias já testadas nas áreas piloto. Na quarta fase, chamada de integração, instaura-se um amplo movimento de educação e envolvimento de todos os funcionários de forma a congregar os times e projetos de melhoria. Finalmente, na fase de excelência, propõe-se a reflexão sobre os resultados até então obtidos e estimula-se a evolução dos métodos e tecnologias aplicados. Assim, este guia estabelece uma sequência de passos evidenciando a importância dos grupos de trabalho como base de mudança enxuta. Contudo, não entra no mérito da criação de uma necessidade, a qual está fortemente ligada à decisão de se adotar um SPE (SILVA, 2008). Crabill et al. (2010) descrevem o Lean Enterprise Model (LEM), o qual visa estabelecer a implementação sistemática da filosofia e das melhores práticas de um SPE e, portanto, integra pontos de vista de engenharia, recursos humanos e do próprio negócio. O LEM, cujo processo de implementação é composto por oito fases (ver Figura 2), foi desenvolvido a partir do compartilhamento e do entendimento de seis modelos de transição já existentes e testados. Seu modelo salienta a importância de se criar uma necessidade real para a mudança enxuta logo na Fase 0, contudo não detalha como proceder para definir esta necessidade. Além disso, destaca a integração do processo de implementação com toda organização, porém não descreve como efetuar avaliações constantes da evolução dos resultados (SILVA, 2008). Figura 1: Lean roadmap de formação dos agentes de transformação enxuta. Fonte: LEI (2010) Figura 2: Interligação dos produtos de cada fase do LEM. Fonte: Crabill et al. (2010). 4. Sustentabilidade da mudança para um SPEMudanças de grande magnitude são caracterizadas por uma grande volatilidade e podem facilmente incorrer em perda do momentum à medida que as prioridades mudam, as pessoas saem ou os agentes de mudança tornam-se céticos em relação ao processo. Estruturas formais podem sustentar ou substituir esforços individuais a fim de manter o momentum mesmo em momentos de dificuldades. Isto se torna especialmente importante em mudanças que não são plenamente definidas em seu início, mas aprendidas e descobertas ao longo do processo (PUCCI et al., 2005). Shah e Ward (2003) analisaram três características organizacionais que podem influenciar na implantação e sustentabilidade da mudança para um SPE: (i) tamanho da planta; (ii) idade da planta e (iii) nível de sindicalização. Com relação à primeira característica, observaram que plantas com mais de mil funcionários implantaram mais extensivamente 20 das 22 práticas enxutas avaliadas no estudo. Apenas para as práticas “times multidisciplinares de trabalho” e “programas de gestão de qualidade” não foram encontradas relações significativas com o tamanho da planta. Por outro lado, apenas 8 das 22 práticas avaliadas se mostraram influenciadas pela idade da planta. Destas, “times multidisciplinares de trabalho”, “redução de tempos de ciclo”, “just-in-time”, “otimização de manutenção”, “times de trabalho auto-dirigidos” e “reengenharia de processos produtivos” apresentam correlação negativa entre sua implantação e a idade da planta. Já “estratégias de programação”, “programas de melhoria de segurança” e “programas de qualidade total” tendem a ser mais facilmente implantadas em plantas com mais de 20 anos de idade. Por fim, somente 6 práticas se mostraram significativamente correlacionadas ao nível de sindicalização de uma planta: “manufatura celular”, “times multidisciplinares de trabalho”, “redução de tempos de ciclo”, “otimização da manutenção”, “capabilidade dos processos” e “times de trabalho auto-dirigidos”. Em todas estas práticas, a correlação encontrada é negativa, isto é, quanto maior o nível de sindicalização da planta, maior é a dificuldade de implantação da prática. Lucey et al. (2004) sugerem 5 principais fatores essenciais para gerar mudanças sustentáveis para um SPE:
Além disso, a implantação de indicadores que permitam monitorar a evolução das melhorias é um fator chave para atingir a sustentabilidade da mudança. Pesquisas de satisfação feitas com funcionários resultam em indicadores que podem ser usados para rastrear o processo de mudança e seu impacto sobre os funcionários da empresa (COMM; MATHAISEL, 2005). 5. Agenda de pesquisaPesquisas futuras em SPE devem focar na formulação de metodologias que possibilitem uma rápida e sustentável reconfiguração tanto dos processos de gestão quanto da estrutura organizacional existente, de forma a obter os benefícios proveniente de um SPE e possibilitar uma competitividade maior da empresa. Alguns desenvolvimentos voltados a pesquisa de SPE, propostos na sequência, tendem a tornar isso possível. 5.1 SindicalizaçãoO principal objetivo de um SPE é eliminar o desperdício de toda e qualquer atividade necessária para produzir um item ou serviço a um cliente. Eliminando o desperdício, as empresas tornam-se mais competitivas e longevas, garantindo os empregos de seus funcionários e evitando impactos financeiros nas famílias e comunidades locais. Sindicatos, por sua vez, têm por objetivo garantir que os direitos dos trabalhadores estão sendo respeitados por seus empregadores. Sendo assim, um dos principais efeitos da transformação enxuta (a manutenção da empresa em seu marcado de atuação) encontra-se alinhado com o propósito dos sindicatos. Contudo, como relatado por Shah e Ward (2003), quanto mais alto o nível de sindicalização de uma planta, mais difícil torna-se a implementação de algumas práticas enxutas essenciais para a melhoria do sistema. Isso evidencia a existência de uma má interpretação dos princípios que regem o SPE tanto por empresas quanto por sindicatos, possibilitando uma oportunidade de desenvolvimento de pesquisas futuras, agora na área de relações trabalhistas. À medida que a transformação enxuta de uma empresa avança e a capacitação de seus funcionários torna-se algo evidente, estes são considerados agentes de melhoria contínua independentemente do nível hierárquico que possuam. Portanto, desenvolvem atividades além do seu escopo original de trabalho o que conflita com as questões trabalhistas vigentes na maioria dos sindicatos, prejudicando as relações entre empresa e sindicato. Se a busca por um SPE for realmente tomada como base da filosofia de trabalho das empresas, as relações trabalhistas também devem sofrer profundas modificações de forma a adequar as necessidades de um SPE àquilo que os trabalhadores estão habilitados, legalmente, a oferecer às empresas. Pesquisas futuras podem contemplar a inserção dos sindicatos no planejamento estratégico enxuto das empresas e discutir o novo papel dos sindicatos em um ambiente enxuto. A proximidade destes com empresas em transição é fundamental para uma mudança bem sucedida. Assim, explorar conceitualmente o papel dos líderes sindicais dentro deste contexto é um campo de pesquisa que merece atenção tanto dos pesquisadores quanto das empresas. 5.2 Gestão de projetos de melhoria em ambientes enxutosO conceito de uma organização enxuta deve ser visto como uma direção a ser seguida e não como um estado a se atingir. Contudo, os projetos de melhoria em empresas tradicionais costumam ter um cronograma de execução com início e término, sendo este um de seus marcos mais importantes (PARK, 2009). Em ambientes enxutos, os projetos, ainda que devam apresentar um cronograma de execução para não frustrar e desmotivar as equipes de trabalho, devem ser inseridos em um planejamento estratégico enxuto, ou seja, devem ser vistos como parte de um processo contínuo, onde processos são executados em paralelo e intercalados com projetos futuros. Assim, abre-se outra frente para estudos futuros que diz respeito a gestão de projetos de melhoria em ambientes enxutos. Uma vez que um dos enfoques da melhoria contínua é constantemente desafiar a condição atual dos processos, os projetos de melhoria não podem ser vistos como atividades isoladas e estanques no tempo. Após finalizado um projeto, conforme seu cronograma original, este, na verdade, deve abrir caminho para outro ciclo de melhoria com múltiplas oportunidades de projetos de melhoria. Isso impõe desafios até mesmo para a equipe de trabalho que, se não souber administrar as ansiedades pessoais de seus integrantes, pode resultar em um sentimento de frustração e descaso com a melhoria contínua. A fim de evitar que isto ocorra, os projetos de melhoria devem ser vistos como apêndices de um estado futuro a ser buscado pela empresa. A noção de que esse estado futuro, quando atingido, tornar-se-á estado atual e um novo estado futuro será traçado é o que permite que as empresas permaneçam competitivas ao longo do tempo. Portanto, pesquisas que investiguem como gerenciar projetos de melhoria em ambientes enxutos são extremamente pertinentes para gerar continuamente o comprometimento das equipes com a melhoria contínua. 5.3 Comunicação enxutaA falta de estudos que lidem com os detalhes operacionais sobre a gestão da comunicação em um ambiente em transição para um SPE é talvez uma das maiores lacunas existentes na literatura atual sobre o tema. As pesquisas existentes apenas comprovam sua importância como catalisadora do processo de transformação enxuta e reconhecem seu papel fundamental no envolvimento dos funcionários nos processos de melhoria contínua da empresa (WORLEY e DOOLEN, 2006; GAGNON e MICHAEL, 2003). Contudo, pouco é dito sobre a forma como são criados os canais de comunicação dentro das organizações em mudança. Muitos são os tópicos relativos a comunicação com oportunidade de serem trabalhados na literatura, tais como: a forma como a comunicação é canalizada entre os níveis hierárquicos de modo a facilitar a migração para um ambiente enxuto, os assuntos a serem enfatizados na comunicação, indivíduos responsáveis por prover informação aos funcionários, tipo de feedback a ser dado relativamente às mudanças desejadas ou implementadas, etc. Além disso, recursos que facilitem o processo de comunicação, desde sistemas visuais até o linguajar utilizado pelos responsáveis por prover informação, são elementos que necessitam atenção por parte das empresas e pesquisadores. Isto se torna necessário à medida que as empresas reconhecem a importância de uma comunicação sistemática voltada à implementação de um SPE, porém os recursos utilizados na comunicação não condizem com a estratégia da empresa ou são sujeitos a intepretação equivocadas por parte dos funcionários. Assim, estudos que possibilitem entender melhor a eficiência dos processos de comunicação e sua implementação dentro das organizações em transformação podem agilizar a mudança de uma empresa para um SPE. 6. Considerações finaisOs princípios de um SPE tornaram-se um importante fator na filosofia de trabalho de empresas que desejam ser cada vez mais competitivas. Agilidade e velocidade de mudança são alguns dos quesitos principais de distinção de uma empresa e suas concorrentes, especialmente em um cenário de mercado cada vez mais globalizado e de intensa competição. Contudo, a implementação de um SPE vai além das técnicas propriamente ditas e não pode ser simplificado a apenas a busca por aplicação de boas práticas de gestão. É justamente neste ponto onde a maior parte das empresas falham ao iniciar seu processo de transformação enxuta. A mudança para um SPE passa por elementos intrísecos das empresas, desde sua estrutura até formas de reconhecimento de seus funcionários. Assim, técnicas de gestão de mudança são necessárias para propiciar a real modificação da filosofia de trabalho das empresas em transição. Este artigo apresenta o estado da arte da literatura sobre gestão de mudança para um sistema enxuto de manufatura. O objetivo é identificar condições necessárias e situações que possibilitem a implementação de um SPE com sucesso e sustentável ao longo do tempo. Além disso, princípios e conceitos fundamentais relacionados a um SPE são discutidos. O estudo revela que, apesar de muito ser conhecido sobre as ferramentas de um SPE, há ainda diversos pontos em aberto relacionados a implementação do sistema. A literatura sobre implementação do SPE ainda é incipiente. A maior parte dos relatos baseiam-se em exemplos de casos limitados ou baseados em implementações de práticas de gestão com benefícios de curto prazo, o que contradiz a filosofia enxuta que proporciona os maiores benefícios no longo prazo. O artigo encerra apresentando alguns direcionamentos para pesquisas futuras. Referências BibliográficasACHANGA, P.; SHEHAB, E.; ROY, R.; NELDER, G. (2006). Critical success factors for lean implementation within SMEs. Journal of Manufacturing Technology Management, v. 17, n. 4, p. 460-471. ARAÚJO, C.; RENTES, A. (2005). A metodologia kaizen na condução de processos de mudança em sistemas de produção enxuta. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 25, Anais. BHASIN, S.; BURCHER, P. (2006). Lean viewed as a philosophy. Journal of Manufacturing Technology Management, v. 17, n. 1, p. 56-72. BOX, S.; PLATTS, K. (2005). Business proces management: establishing and maintaining project alignment. Business Process Management Journal. Vol. 11, n. 4, p. 370-387. BRITO, E. (2004). Gestão dos recursos humanos no Sistema Toyota de Produção. www.lean.org.br. COMM, C.; MATHAISEL, D. (2005). An exploratory study of best lean sustainability practices in higher education. 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